Friday, June 13, 2025
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Weekend reads #59 – by Lucas Marcomini

As pessoas que compõe o mundo de tecnologia sempre se orgulharam de se dizerem racionalistas, a maioria associando a isso o ateísmo. Eles se consideram homens da engenharia, onde as coisas são diretas e literais, e o mundo funciona por a+b. Mas desde o principio sempre houve uma certa religiosidade sobre o mundo tech. De visões sobre evangelização de usuários à construção de um “novo mundo” a partir da tecnologia não há nada de novo sobre como eles pensam o mundo e a sociedade. Alguns até acreditam que a engenharia, a habilidade de “construir”, é semelhante aos poderes divinos de conjurar algo a partir de nada. O vale do silício tem sua literatura, suas crenças e rituais, mas eles nunca tiveram um deus de maneira definida, ou ao menos próxima. A aceleração da inteligência artificial mudou isso, e é engraçado (ou até assustador em alguns casos) de ver como muitos deles se embasbacam com seu próprio poder imaginativo de como será um mundo comandado por uma inteligência artificial, sendo que estão apenas reproduzindo os processos mais básicos que a humanidade vem fazendo com suas religiões desde sempre. Questionamentos sobre se a suprema IA será benevolente ou tirânica, se ela poderá dar superpoderes ao homem ou eliminá-lo, e até mesmo se os descrentes ou pecadores poderão ser designados para uma espécie de purgatório ou inferno. Eles assumem o papel de profetas, congregando ao redor de suas teses e gerando cismas a partir de desentendimentos e divergências de interpretações. Já existem inclusive ditas religiões que tem sua teologia baseada na tecnologia e existência de uma entidade artificial onipresente, onipotente e onisciente (embora, como esperado, a maioria seja apenas golpistas tentando enriquecer). Figuras mais obscuras do mundo tech como Peter Thiel veem de fato nas religiões um playbook sobre como consolidar seu poder e capacidade de criar um mundo que mantenha os profetas da tecnologia na mesma estrutura social que as religiões sempre utilizaram. Os profetas tem uma posição privilegiada, pois eles são os porta-vozes da divindade com a sociedade, e ninguém mais. Questionar sua posição é questionar a própria divindade e suas vontades, heresia cabível de punições severas. Em mundo complexo mais pessoas estão vulneráveis a medos, receios e insegurança, necessitadas de conforto, sensação de controle e de que há um motivo para que as coisas aconteçam. Para muitas delas a tecnologia, uma interface que não só ouve, mas também responde, é mais palpável e simples de crer.

But we are afraid. It’s tempting to choose a different path, to distract ourselves, to attempt to control the uncontrollable, to try to become something we are not, to escape fate’s harsh but beautiful decree: that we are human and mortal. If we are traditionally religious, we take this second path by immersing ourselves in a kind of storytelling that can be delusional at times but can also possess great beauty of its own — what the great poet Wallace Stevens, among others, called “poetic truth.” But nonreligious people, too, can crave escape into what psychologist Ernest Becker called the “denial of death.” Just telling ourselves we want power or money, or fame or convenience, is not ennobling. Some prefer a story so big it makes religions of antiquity seem small by comparison.

Muito da lenda da indústria cripto foi baseada na necessidade de se descentralizar o mercado financeiro, cuja estrutura atual era vista quase que como malévola pelos idealistas, uma associação criminosa entre bancos e governos. Matt Levine tem uma teoria interessante de que o mundo cripto, muito composto por pessoas do mundo de tecnologia, passou os últimos 20 anos tentando criar um sistema financeiro do zero, e por consequência aprendendo a duras penas todas as lições que o sistema financeiro tradicional aprendeu durante sua história. Da necessidade de estabilidade na moeda para que ela funcione como meio de troca ao entendimento de questões de liquidez e alavancagem, várias dessas lições acabaram mudando a visão idealizada dos profetas cripto para algo mais próximo a um sistema financeiro totalmente privado. Como base desse modelo estão as stablecoins, criptomoedas pareadas a uma moeda fiduciária, como o dólar. Se lembrarmos de como surgiram os bancos vamos ver que os cidadãos que tinham ouro ou formas iniciais de dinheiro usavam os bancos como cofre, um lugar seguro para deixar seu dinheiro de verdade, enquanto o banco devolvia um documento que certificava que o cliente tinha aquele valor depositado. Esses certificados muitas vezes passavam a ser trocados entre cidadãos, pois representava dinheiro. E o que seria uma stablecoin? A USDC, por exemplo. Você, cidadão, vai até uma exchange ou carteira cripto e deposita um dólar, em troca, você recebe uma unidade de USDC, um certificado de que você possuí um dólar. Incrível. Você pode até mesmo trocar esse certificado com outras pessoas, pois ele representa um valor real depositado. Indo mais a fundo, a empresa responsável pela USDC pega o seu dólar depositado e aplica ele em títulos de curtíssimo prazo do tesouro americano. Há uma corrente de pensamento no mercado financeiro de que o papel de intermediário dos bancos, ter depósitos que são de baixo risco para o depositante e aplica-los em negócios de alto risco é problemático e as duas atividades deveriam ser separadas, uma teoria chamada de narrow banking. Claro, problemas acontecem, mas via de regra as lições aprendidas tornaram o sistema muito mais seguro do que era anteriormente. E essa intermediação é importante. A habilidade de aplicar recursos seguros em atividades de risco é o que permite investimentos por parte de empresas e tomada de risco que dinamizam a economia. Stablecoins (as mais seguras, pelo menos) são um tipo de narrow banking. Algumas das emissoras de stablecoins estão inclusive solicitando licenças bancárias. O próximo passo seria emprestar dinheiro?

This is a little funny because crypto is to some extent a reaction against traditional banking. Satoshi Nakamoto invented Bitcoin in part in disgust at the 2008 financial crisis. And cryptocurrencies are distinct from dollars in that a dollar fundamentally is a debt obligation of a bank, while a Bitcoin fundamentally isn’t; crypto is a form of non-debt money, a way to have money and payments and bank accounts without traditional banking. I wrote in 2023 that crypto “to some extent started as a backlash to fractional reserve banking and the shadow banking crisis of 2008, and by last year had matured to the point that it recreated both fractional reserve banking (but without regulation!) and a 2008-style shadow banking crisis.” But that is just the beginning of the story. Perhaps the future is that crypto will fully recreate normal banking, including bank regulation.

Uma visão comum é a de que homem e natureza são opostos, e que para um progredir o outro precisa sofrer. Uma idealização da natureza como força benevolente e ambiente pacífico. Nesse sentido muitos entendem que espaços dominados e moldados pelo ser humano, ao serem abandonados, progrediriam para seu estado “natural”. Mas a natureza não é ordeira e estável, e sim caótica. Estudos práticos de locais abandonados em diferentes ecossistemas mostram que na ausência do homem como força ativa outras espécies, sejam elas plantas ou animais, tendem a ocupar o vácuo deixado, muitas vezes criando ambientes pobres em biodiversidade, e algumas vezes mais pobres do que durante a ocupação humana. A natureza é um sistema complexo que nunca está em equilíbrio, os que existem nele estão sempre impactando o estado atual e futuro do sistema. Antes do homem espécies de megafauna, como mamutes, bisões e ursos ativamente modificavam seus ambientes, criando ou destruindo florestas, campos e pradarias. Alguns estudos mostram que a presença do homem até aumentou a biodiversidade em alguns ecossistemas através de medidas de controle de pragas e espécies dominantes. Os povos indígenas, por exemplo, através da caça e colheita, ativamente gerenciavam os ecossistemas em que viviam em torno de um equilíbrio que garantisse alimentos e as condições para sua sobrevivência. Locais ocupados e que foram abandonados muitas vezes apresentam monoculturas de pragas que impedem a proliferação de outras espécies de flora e fauna, por exemplo, criando desertos de biodiversidade as vezes mais pobres que um latifúndio de soja. O ponto é que nosso relacionamento de mais ou menos biodiversidade, mais ou menos do estado “natural” das coisas associado ao moralismo de bom ou ruim é irrelevante para a natureza como a entendemos. Isso não quer dizer que não devemos nos preocupar com os conceitos que criamos sobre a natureza porque eles podem ser bons ou ruins para a humanidade. A natureza não se importa se a floresta amazônica está de pé e preservada, mas o homem precisa da regulação climática exercida pela floresta, como da umidade que da origem às chuvas que abastecem a américa latina e os remédios e outras substâncias que são descobertos na biodiversidade da flora. Para a natureza os conceitos criados pelo homem são inconsequentes, mas para nós não. Precisamos de processos de recuperação que criem ecossistemas diversos e resilientes pelo bem da humanidade, e não por uma suposta crença em uma entidade natural.

There is no question that recent human activity – particularly the massive clearing of ecosystems and industrial consumption of fossil fuels – has been an ecological catastrophe. But for nature to be restored to a past version of itself, the question might be less one of human absence, than what form human presence can take.

Eu não consigo lembrar a última vez que assisti alguma coisa na Netflix, ou Amazon Prime. As grandes plataformas de streaming não associadas a estúdios surgiram como uma revolução que buscava tornar mais cômoda a experiência de assistir filmes em casa, passando depois a incorporar também o mundo da TV. A sua lógica de operação sempre foi muito diferente dos estúdios de Hollywood. Os estúdios buscam fazer filmes que tivessem atrativos e marcos, que ressoassem com o expectador de alguma forma, coloca-los no cinema e divulga-los para atrair o público que pagaria para assisti-los como modelo de negócio. A métrica de sucesso é pública, com os números de expectadores e receita indicando o que deu certo ou não, com os filmes vindo a ser parte da cultura popular ou de algum nicho e potencialmente sendo reconhecidos em alguma premiação. Após o cinema os estúdios, diretores, roteiristas e atores poderiam continuar recebendo pelo seu trabalho através da divisão de lucros residuais pela vida do filme. Na história de origem da Netflix, um dos fundadores conta ter alugado um filme e esquecido de devolver, ficando com uma conta alta pelo atraso, história que depois descobrimos ser falsa, mas que resumia a insatisfação comum do público com o modelo. A Blockbuster tinha uma posição confortável, e as multas representavam uma importante contribuição para o resultado da empresa, os clientes estavam em um contexto que a própria empresa chamava de insatisfação controlada. A Netflix era o esforço heróico para acabar com essa insatisfação. Mas poucos diriam que a experiência de pagar a assinatura da plataforma e passar mais tempo buscando algo para assistir do que assistindo de fato não possa ter a mesma descrição. Ao contrário dos estúdios, que tinham como objetivo fazer mais pessoas assistirem seus filmes, a Netflix tem como meta ter mais assinantes pagos. Não importa se eles assistam algo ou não, se há algo bom ou interessante para se assistir ou não, desde que eles paguem. A mudança do mecanismo de incentivo para a empresa embutida nessa mudança de modelo altera fundamentalmente a lógica da produção de novos filmes. Enquanto a Netflix precisava construir sua marca e estoque ela chegou a apostar em filmes independentes e de produções de qualidade, mas hoje a produção in house mais parece um feed do TikTok. A maior parte do conteúdo produzido pela empresa é feito para pessoas que não vão assistir de fato ao filme, em uma categoria chamada de “casual viewing”. São filmes que até podem ter atores e diretores famosos, mas que ninguém se lembra. Eles são feitos para você assistir enquanto está no TikTok, lavando a louça ou só não quer prestar atenção. As métricas de audiência divulgadas pela Netflix são extremamente obscuras e muitas vezes bastante criativas. Por exemplo, a empresa passou a divulgar somente em 2023 a métrica de audiência de cada produção em sua prateleira, mas o número de expectadores era calculado a partir do tempo total de visualização do conteúdo dividido pela sua duração. Isso significa que se em um filme de 100 minutos, 100 pessoas assistirem 1 minuto do filme (muito provavelmente pela função de autoplay), isso contaria como um expectador. A Apple é provavelmente a única exceção em termos de qualidade e relevância cultural, mas também é uma plataforma que da prejuízo para sua dona. Como todas as plataformas que dominaram a distribuição e precisam de mais conteúdo de custo zero para alimentar seus algoritmos de recomendação em busca de aumentar o tempo de tela a IA Generativa também aparece no futuro da Netflix de maneira clara. Hoje ela já produz filmes baseada no que o algoritmo aponta como alavancas das métricas da empresa, mas em breve ela poderá fazer isso a custos muito mais baixos. A falta de filmes originais e a repetição excessiva de filmes das mesmas franquias são um sintoma da algoritmização. Se estamos olhando para o passado para saber o que fazer hoje, o que “funciona”, dificilmente vamos criar algo novo e interessante.

But if Netflix now occupies a place in the market similar to cable companies, the business it’s most spiritually aligned with is Blockbuster: a widely disliked service staffed by people who know nothing about movies, stocked with thousands of titles to see, few of them worth watching. Even Netflix knows its users can’t find titles that they like. In 2021, the company briefly introduced a new feature on its home page, called “Play Something,” to help in what the streamer called “times when we just don’t want to make decisions.” When clicked, Play Something instantly began playing for users an algorithmically chosen series or film. “Whether you’re in the mood for a new or familiar favorite,” Netflix wrote, “just ‘Play Something’ and let Netflix handle the rest.”

“Play Something,” as in: play anything. It doesn’t matter if it’s good or bad, if a user is on their phone or cleaning their room. What matters is that it’s on, and that it stays on until Netflix asks its perennial question, a prompt that appears when the platform thinks a user has fallen asleep: “Are you still watching?”

Bom final de semana!

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